sexta-feira, 4 de maio de 2012

SONHOS


OS SONHOS NOS DESPERTAM 

“Somos do mesmo material de que são feitos os sonhos; nossa breve vida está envolvida por um sono.“  (Shakespeare – Tempest – Ato 4, Cena I)

        Passamos aproximadamente a terça parte da nossa vida dormindo e, na maioria das vezes, sonhamos, mesmo que, ao acordar, não nos lembremos. Sendo assim, os sonhos têm exercido considerável fascínio sobre nós desde sempre, por representarem uma vivência psíquica tão intensa quanto a que sentimos quando acordados. Todos os povos, das eras mais antigas aos nossos dias, têm procurado um sentido para os sonhos ou, pelo menos, tentado entender, mesmo de forma mecânica, nossa vida onírica. Os sonhos já foram vistos como uma forma de previsão e avisos para várias religiões e crenças, inclusive em relatos bíblicos. Na Grécia antiga, os sonhos serviam como guias para curas nos templos. As pessoas doentes ficavam, por dias, em lugares considerados sagrados esperando sonhar o 'sonho certo' e, ao sonhar com um Deus, certamente ficariam curadas. Era o que se chamava incubação. Contudo, até hoje, muitos  consideram  os sonhos completamente sem sentido e sem nexo, como a maioria dos cientistas, vendo-os apenas ligados a reações físicas e fisiológicas.
        Com Freud e o surgimento da Psicanálise, o interesse pelos sonhos desenvolveu-se bastante e esses tornaram-se tema de pesquisa no campo cientifico da época. Mesmo assim, ainda eram vistos como uma representação limitada de desejos reprimidos pela pessoa que sonhava. Freud acreditava que eram produtos de uma censura que fazia com que a imagem viesse de forma irreconhecível para o sonhador durante o sonho e seu conteúdo tinha sempre um sentido sexual. Carl Gustav Jung, por sua vez, desenvolveu uma teoria mais ampla sobre os sonhos. Segundo ele, estes não só representam algo pessoal, imagens de complexos da psique subjetiva, como trazem mensagens do inconsciente coletivo através de símbolos, geralmente representados por arquétipos. Dessa forma, Jung passa a dar aos sonhos uma função tão importante, psiquicamente falando, quanto sempre foi dada à consciência desperta e afirma que eles existem exatamente para estabelecer uma relação entre a vida consciente e a inconsciente.
        O sonho também pode ter um sentido compensador. Segundo Jung, os símbolos que surgem nos sonhos contêm o complemento inconsciente da consciência e têm por objetivo compensar a unilateralidade dos erros, desvios e atalhos da nossa atitude consciente. Compensare (do Latim) significa igualar, fazer um ajuste; quando a atitude consciente é muito unilateral, muito radical, a compensação costuma ser mais evidente e acontece se precisamos compensar algo ruim que estamos vivendo ética ou moralmente, ou um excesso de inflação, sempre algo que tende para um lado só e que desequilibra nossa energia mental. Um exemplo disso é quando, estando passando por uma situação triste, sonharmos com algo alegre ou, se nos achamos muito importantes, podemos sonhar com situações que nos mostram o oposto disso. Essa visão nos lembra que não devemos esquecer que o lado bom contém a semente do mal e o lado mal contém a semente do bem.
        Diferente de Freud, Jung achava que saber o porque do sonho tinha pouca importância, mais importante é saber o para quê. Para Jung, na psique, nada acontece  por acaso, e os sonhos têm um sentido, uma razão de ser, há neles uma intencionalidade. Sua função, além de compensadora é preventiva, trazendo uma orientação que mostra para onde está se dirigindo a energia psíquica e o que devemos modificar em nosso comportamento.
        Jung acreditava que a análise dos sonhos através da descoberta de conteúdos que estariam inconscientes, ajudaria nos tratamentos das neuroses. Dizia que pelas imagens oníricas pode-se confirmar as emoções vividas pelo paciente e assim melhorar o diagnóstico e o prognóstico em relação à sua saúde mental, pois pela anamnese pode-se apenas entrever essas vivências.
        Nos sonhos o inconsciente é revelado através de símbolos. As imagens simbólicas dos sonhos despertam camadas internas importantes  para nosso equilíbrio mental, pois o símbolo é condutor de energia e, ao ser assimilado pela consciência, pode modificar e transformar a energia psiquica, criando a possibilidade de cura ao trazer uma maior consciência do que se passa conosco. Isto confirma a afirmação de Jung quando disse :”Quem olha para fora sonha, quem olha para dentro acorda”
        Por isso convém estarmos atentos a vários sonhos em seqüência; as séries oníricas ajudam no entendimento das mensagens que o inconsciente está mandando e esse processo é extremamente transformador, tornando-se um caminho de orientação para as pessoas resolverem alguns problemas e conflitos. Existem também os sonhos recorrentes, de situações que se repetem, estes estariam chamando a atenção para algo que precisa ser reconhecido em nós e integrado ao nosso ser.
        No entanto, interpretar sonhos não é nada fácil, muitas vezes eles tornam-se bem obscuros e nós não conseguimos perceber suas mensagens, e a que parece fácil demais não costuma ser a melhor interpretação.  Jung chamou muito a atenção para o fato de que a interpretação dos sonhos deve ser feita pelo analista sempre em concordância com o paciente; que o terapeuta não deve jamais tentar explicar o sonho através de alguma teoria prévia, mas sim buscar o entendimento por meio da realidade específica daquele paciente ou, de outra forma, estaria sugestionando o mesmo.
        Em “Arquétipos do Inconsciente Coletivo” Jung diz algo muito especial e bonito: “Os processos naturais de transformação são anunciados principalmente nos sonhos...é como o renascimento de outro ser...o “outro ser” em nós...a personalidade futura mais ampla...como um amigo interno da alma...no qual a própria natureza gostaria de nos transmutar, naquele outro que também somos, e que nunca chegamos a alcançar plenamente...o homem existe como um par... em que um é mortal e o outro é imortal...os processos de transformação que vivemos pretendem aproximar ambos, a consciência porém resiste a isso, porque o outro lhe parece, de início, estranho e inquietante e sempre preferimos ser “eu” e mais nada. Mas confrontamo-nos com o amigo ou inimigo interior da alma, e de nós depende se ele vai ser um ou outro.”
        O tratamento analítico deve ser uma "tomada de consciência" do nosso lado inconsciente, necessitando da participação da personalidade total do paciente e de suas experiências de vida. Por isso mesmo, não se pode, de forma alguma, restringir a interpretação de um sonho por meio de alguma doutrina específica e determinista, que considera uma determinada imagem como tendo sempre um mesmo significado, independente da pessoa que sonhou, do seu histórico e das circunstâncias que podem ter ajudado a induzir o sonho em questão.  Diante de um sonho  que uma mulher lhe contara , no qual ela via um animal mecânico, feito de diamantes, vivo e andando, Jung  falou: “Isso é para lhe provar que o impossível é possível. Você ainda é racional demais, você não está aberta para milagres, mas eles existem.  No reino da psique, milagres podem acontecer!” (Marie Louise Von Franz – “O Caminho dos Sonhos”)
        Dormindo ou acordados, sabemos que a nossa mente possui a força necessária para realizar os milagres que ansiamos. Além dessa realidade psíquica, todas as pesquisas psicológicas realizadas sobre os sonhos ajudaram a provar a existência do mundo inconsciente e do poder que ele exerce sobre nossa vida consciente.
        Para quem tem fé não é preciso saber disso tudo para acreditar mais ou menos em milagres, mas essas pesquisas e esse conhecimento nos mostram, na prática, que somos orientados por uma inteligência superior e portanto, nos ajudam a acreditarmos com maior firmeza e confiança, que recebemos recados e orientações o tempo todo através dos nossos sonhos! E mesmo não conseguindo interpretar seus simbolismos claramente, os sonhos servem como agentes transformadores da nossa energia psíquica, ajudam a nos reequilibrarmos e são participantes indispensáveis do nosso processo de individuação, que seria o processo que gera um “individuum” psicológico, ou seja, uma unidade indivisível, um todo, é a condução da personalidade em direção à totalidade. 

Bons sonhos para todos...
Rosa Carmen

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